quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Em Defesa da Reserva de Vagas nas Universidades Públicas do Brasil


Já faz algum tempo que venho defendendo a idéia de uma necessária e urgente reforma do Estado brasileiro. Não falo de uma reforma puramente estrutural no prisma político-econômico, mas uma reforma que proporcione a superação dos paradigmas liberais e sociais de Estado. Pensamos em uma reforma que de condições às instituições governativas garantirem a efetividade de um Estado democrático de Direito. Um Estado que seja legitimado na cidadania popular, onde os destinatários das normas possam ao mesmo tempo, se reconhecerem como os construtores das mesmas. Neste paradigma garantido na Constituição Federal de 1988, mas ainda inexistente na prática, não há que se falar em ações afirmativas. Nele a sociedade é democrática por excelência, neste sentido, qualquer um do povo pode se auto-incluir no sistema. Os direitos fundamentais como a educação podem ser exigidos de plano, orientados pelo princípio da dignidade da pessoa humana.
Contudo, se este é um Estado onde não se admite políticas compensatórias, por partir do princípio de que a sociedade é igual por excelência, por que defendemos a reserva de vagas na educação brasileira? Em primeiro lugar: queremos mostrar que é necessário reformarmos o Estado. Em segundo lugar: queremos refletir como se pode chegar a uma reforma estatal de fato. Em política não há mágica. O que existe são ações concretas a curto médio e longo prazo. Acho cansativo quando intelectuais, políticos ou atores sociais, vão para os meios de comunicação falar que a política de reserva de vagas é um erro, sustentando que isso estaria gerando discriminação e ferindo a igualdade de todos perante a lei. Falam cheios de convicções: "o governo deveria investir nas escolas publicas". Pois bem, neste discurso devemos primeiramente observar os lobos vestidos de cordeiros. Percebemos claramente um discurso ideológico onde até donos de instituições privadas criam uma idéia de que os beneficiários das reservas de vagas estariam sendo vitimas de discriminação pelo próprio Estado. Porém ao desconstruír este discurso, chegamos ao que é real. É o que é real? Bem é real um congresso conservador que vem ao logo da historia impedindo que o Estado invista no ensino fundamental e médio, por pensar que a iniciativa privada tem melhores condições de gerir a educação no país. É real a dificuldade em convencer parlamentares conservadores que é importante a criação do Fundeb para garantir recursos para o ensino básico. É real também a desregulamentação do ensino público, em detrimento do ensino privado com a contribuição de políticos que ao invés de estarem a serviço do povo estão prestando um trabalho às corporações.
Concordo com o constitucionalista Jose Luis Quadros de Magalhães autor do livro "Direito Constitucional" dois volumes, quando ele diz que o Brasil nem outros paises da América latina não vivenciaram o Estado do Bem Estar Social como os paises da Europa. Digo isto principalmente no âmbito da educação. Não somos defensores do Estado Social, mas não descartamos a sua importância em um determinado momento histórico. Não tenho dúvidas de que se tivéssemos vivenciado o Estado Social como nos países europeus teríamos diferenças estruturais importantes na sociedade brasileira. Mas na verdade, o que queremos dizer é que não chegaremos à existência de uma democracia sólida com um passe de mágica.
É necessária sim a reserva de vagas para que o pobre, o negro e os excluídos da sociedade brasileira tenham acesso ao conhecimento para que eles, o povo, possa transformar o Estado. São eles a maioria do povo brasileiro e são eles que um dia reconheceram que não mais necessitam de uma política compensatória e poderão de fato intervir na sociedade. Impedir que eles tenham acesso à educação, por meio da reserva de vagas, é impedir que de forma concreta cheguemos a reforma do Estado. Ao reconhecermos o déficit social para com os pobres e aplicar políticas que iram sanar esta dívida estamos trabalhando para que estas pessoas possam através de uma tomada de consciência separar o joio do trigo. O discurso que procura descaracterizar a política de vagas esconde o medo de um dia termos nos excluídos o sentimento necessário para provocar mudanças estruturais no sistema político. Quem pode de fato transformar a sociedade é o povo. Penso que a reserva de vagas nas universidades públicas do Brasil é um instrumento político fundamental para que possamos, mais tarde, chegarmos a implementar um Estado Democrático. Reserva de vagas é oportunidade política de transformação social. Temos que investir na escola pública sim, também somos a favor deste discurso, mas iludir os mais pobres com a idéia de que eles devem esperar que o Estado invista no ensino fundamental e médio é um cinismo descarado. Ora a mais de 400 anos elites políticas controlam o poder e o que fizeram foi precarizar o ensino público e gratuito de forma desastrosa. Ou será que agora eles ficaram bonzinhos é quererem resolver o problema retomando os investimentos no ensino público? Nunca pensaram a sociedade como um projeto coletivo de igualdade. O que temos hoje é um ensino público precário, e uma sociedade onde acesso a educação de qualidade é para quem tem recursos econômicos. Situação típica do liberalismo.
Acredito na reforma do Estado, sou defensor do Estado Democrático, mas sei que para alcançá-lo é necessário que ele seja visualizado pelo povo e não pela intelectualidade de poucos especialistas. Defender a reserva de vagas é acreditar que um dia, os que hoje são beneficiários serão os reformadores do amanhã. Queremos uma sociedade mais justa e o povo tem um papel importante nesta construção. Não acredito que as transformações, necessárias ao país, virá de políticos conservadores, estes não querem o desenvolvimento do país, querem na verdade uma reforma que sirva para o Estado manter as estruturas oligárquicas existentes na sociedade e nada mais. Por tudo isso, queremos a reserva de vaga elas são importantes para o Brasil.

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